Mesmo após um longo tratamento, a acne pode deixar algumas marcas, como as temidas cicatrizes. “Isso acontece porque as glândulas das quais se originam as espinhas estão na derme profunda. Logo, as fibras de colágeno e elastina da pele têm sua arquitetura comprometida pela acne, gerando cicatrizes profundas”, explica a dermatologista e tricologista Dra. Kédima Nassif, membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia. Porém, ainda não é claro o que leva ao surgimento destas cicatrizes, visto que a alteração não surge em todos os pacientes com acne e difere da cicatrização comum. Então, pesquisadores coreanos resolveram investigar como as inflamações e as alterações no tecido estão envolvidas na cicatrização da acne. Na pesquisa, os autores descobriram que o processo parece ser articulado pela sinalização do fator de crescimento TGF-β1, o que levanta a possibilidade de um tratamento que, através da inibição da inflamação e da sinalização do fator de crescimento, pode ter o potencial de prevenir a formação de cicatrizes.
Para chegar aos resultados deste estudo, publicado no British Journal of Dermatology, os pesquisadores compararam perfis moleculares da pele e lesões acneicas de pacientes propensos a formação de cicatriz e daqueles que não possuem tendência a cicatrizes pós-acne. Ao todo, o estudo incluiu 30 pacientes que tinham acne na face, sendo que 15 eram propensos a cicatrizes atróficas, com 30 ou mais cicatrizes de acne no rosto, e 15 pacientes que quase não possuíam cicatrizes. Destes pacientes foram retiradas cinco amostras de lesões de acne que foram submetidas a biopsia, sendo uma do tecido normal, uma da espinha no dia de seu surgimento, seguida por uma no terceiro e sétimo dia e, por fim, uma do tecido maduro, quando a acne já tinha ocorrido há mais de três meses. “Nas cicatrizes, os pesquisadores observaram uma deficiência significativa do total de fibras elásticas, além de descobrirem que esta falta de fibras já existe desde o início da inflamação da acne”, destaca a dermatologista.
De acordo com a Dra. Kédima, no processo de cicatrização as fibras de colágeno são essenciais e tem sido sugerido que uma relação distorcida de colágeno 1 e 3, bem como a quantidade de fibras de colágeno, podem afetar a organização anormal da matriz extracelular, modificando posteriormente a tensão e estrutura da pele. “As conclusões do estudo indicam severa destruição dos colágenos 1 e 3, mas houve um aumento de colágeno 1 maior nos pacientes propensos a formação de cicatriz, o que pode afetar a organização normal da matriz extracelular, implicando então que a degradação ocorre mais no colágeno 3 nestes pacientes.” E o estudo sugere que o aumento do fator de crescimento TGF-β1, que promove a recuperação compensatória do colágeno 1 mais que do colágeno 3, pode estar envolvido nesse processo.
O estudo demonstrou também que este fator de crescimento desempenha um papel importante como modulador da inflamação e formação de cicatriz no início das lesões da acne, regulando diretamente a formação de tecidos fibrosos, ou manipulando a proliferação de queratinócitos, células que formam a primeira camada da pele. “Os pesquisadores observaram que o TGF-β1 estimula a síntese de matriz extracelular, a proliferação de fibroblastos, cuja função é sintetizar colágeno e elastina, e a diferenciação de miofibroblastos, responsáveis pela contração do tecido durante a cicatrização, além de restringir a proliferação de queratinócitos. Sendo assim, presume-se que o TGF-β1 pode ter um efeito sobre a cicatrização da acne, não só fortalecendo a inflamação, mas também afetando a própria formação da cicatriz e recuperação da pele”, completa a Dra. Kédima.
A pesquisa mostra-se então fundamental no tratamento das cicatrizes de acne, pois, até o momento, todos as abordagens para a melhora destas alterações, como microagulhamento e uso de células troncos, são focadas na produção de novas fibras de colágeno em cicatrizes já formadas, o que faz com que sua eficácia seja, muitas vezes, insatisfatória. “A solução para as cicatrizes atróficas de acne deve ser baseada na prevenção destas alterações através da intervenção já nos estágios iniciais da acne. Portanto, é de se esperar que esta pesquisa forneça evidências suficientes para a formulação de novas estratégias de combate as cicatrizes de acne, como agentes anti-inflamatórios ou anti-TGF-β1”, finaliza a Dra. Kédima Nassif.